segunda-feira, 29 de maio de 2017

Harmônicos: O que são?

                                           Gabriel Kulevicz da Silva, Edilberto Costa Neto

           Neste texto será abordado um assunto muito importante e esperamos que com essa leitura, você passe a entender os sons de uma nova maneira. Com este texto, você vai aprender o que é uma frequência e também conseguir compreender como é possível diferenciar um som de piano de um som de guitarra ou de qualquer outro instrumento. Além disso, iremos explicar brevemente o funcionamento de um equalizador de áudio e qual a função dele.

O que é frequência?
            A primeira coisa que temos que aprender é: O que é uma frequência?
Não vamos nos ater aqui a definições formais. O que temos que entender é apenas alguns conceitos básicos:
1. A frequência de uma onda sonora é medida em Hertz (Hz);
2. Essa unidade (Hz) indica a quantidade de “ciclos por segundo” de alguma coisa.

Figura 1: Frequência de uma onda sonora.

Na Figura 1, estão representadas duas ondas sonoras com frequências diferentes. O eixo horizontal representa o tempo (em segundos) e o eixo vertical representa a amplitude da onda (em Volts, pois estamos lidando com sinais elétricos). Perceba que o sinal de cima completa um ciclo em 1 segundo, ou seja, esse sinal é de 1 Hz (1 ciclo por segundo). O sinal de baixo completa 2 ciclos em 1 segundo, portanto, possui uma maior frequência (no caso 2Hz). Portando, quanto maior o número de ciclos por segundo, maior a frequência.
Em música, dizemos que, se um som possui uma frequência maior que outro som, ele é mais “agudo” ou mais “alto”. Portanto, aqui já podemos aprender uma coisa: Quando falamos em “altura” do som, estamos falando da frequência desse som. Quanto mais “baixa” a frequência, mais “grave” é o som e quanto mais alta a frequência, mais agudo é o som. Você com certeza deve ter escutado alguém falar: “Esse som está muito alto! Vou baixar o som!”, referindo-se ao volume do som. Mas essa forma de dizer não é correta. O correto seria: “Esse som está muito forte! Vou diminuir o volume!”.

 Representação em frequência
Agora já sabemos o que é uma frequência, e isso será de extrema importância para a continuação do texto. Vamos ver agora uma representação que é comumente encontrada quando estamos avaliando sinais de áudio. Essa representação é a representação em frequência, e contém no eixo horizontal a frequência, geralmente medida em Hz (o eixo vertical geralmente é apresentado em dB e não em Volts, mas sobre o que é esse “dB” iremos falar em outra postagem!). Veja a representação dos dois sinais da Figura 1 na Figura 2. Perceba que com esse tipo de representação, podemos saber a frequência do sinal sem precisar realizar cálculos! Iremos utilizar essa representação em diversos gráficos do nosso blog.

Figura 2: Representação em frequência dos sinais da Figura 1.

Harmônicos
Agora gostaríamos que você respondesse a uma pergunta: Quando tocamos apenas uma corda da guitarra (digamos a primeira corda, nota “mi”), estamos produzindo apenas uma frequência?
A resposta intuitiva é: Sim, claro... é apenas uma nota...  a “mi”... e de acordo com uma tabela que vi na internet, a nota mi da primeira corda da guitarra tem a frequência de 330 Hz. Para gerar outras frequências precisaríamos tocar um acorde...
Mas, na verdade não é bem assim... Como assim???
Iremos apresentar um conceito novo e esperamos que seja tão surpreendente para você como foi conosco quando descobrimos isso. Antes, pensávamos que tocando uma corda tínhamos apenas uma frequência, e tocando um acorde, tínhamos várias frequências soando juntas.
Agora, veja a Figura 3, onde é apresentado o gráfico em frequência do sinal da primeira corda de uma guitarra (nota “mi”). Esse gráfico é de um sinal real de guitarra e possui ruídos de gravação entre outras imperfeições, por conta disso vemos na região de baixa amplitude um ruído na curva. Mas é bem perceptível que no gráfico temos vários picos de amplitude. O primeiro deles, e com maior amplitude, é referente a frequência de 330Hz. O segundo, é referente a 660 Hz e o terceiro, a 990 Hz. Além desses três, existem diversos outros picos em frequências mais elevadas. Ou seja, o som de uma corda da guitarra, ao soar, apresenta diversas frequências diferentes e não apenas uma!

Figura 3: Análise em frequência da primeira corda de uma guitarra (mi).

Agora vamos dar nome a essas frequências que aparecem no gráfico da Figura 3. A frequência que encontramos na internet (a de 330 Hz para o caso da nota “mi”), que no gráfico apresenta a maior amplitude, é chamada de “frequência fundamental”. Esta é a frequência que define qual nota estamos tocando (no caso a nota “mi”). O que acontece é que, além da frequência fundamental, o som de uma corda de guitarra é composto por diversas frequências que soam ao mesmo tempo. Essas frequências (além da frequência fundamental) são chamadas de “harmônicos”. No caso do gráfico apresentado na Figura 3, podemos perceber diversos harmônicos. Isso acontece com qualquer nota tocada por um instrumento musical convencional: flauta, violão, guitarra, acordeom, piano, voz, violino, entre outros. Incrível, não? A Figura 4 ilustra novamente o mesmo caso, porém, explicitando qual é a frequência fundamental e quais são os harmônicos. 

Figura 4: Frequência fundamental e harmônicos.

Abrimos aqui um parêntese com alguns conceitos musicais interessantes que relacionam acordes, tonalidades e harmônicos (ou seja, a relação direta entre música, física e matemática!). Se formos procurar em uma tabela de notas musicais, vamos que a frequência de 660Hz corresponde a nota “mi” uma oitava acima do primeiro “mi”, de 330 Hz. A frequência de 990 Hz corresponde à nota “si”, que é o quinto grau da escala de Mi Maior. O próximo harmônico é em aproximadamente 1320 Hz (novamente nota “mi”, uma oitava acima) e o próximo é de aproximadamente 1560 Hz, que corresponde a nota “sol”, e assim por diante. Mas o que é mais curioso nisso tudo? Perceba que os harmônicos de maior amplitude são pertencentes ao acorde de Mi Maior (Mi Sol Si)! Então não é por acaso que um acorde maior soa bem aos nossos ouvidos!!! Bom, quem sabe no futuro falamos um pouco mais desse assunto em outra postagem. Mas, interessante, não? 

Timbre: Como diferenciamos um instrumento de outro?
Agora vamos a mais uma pergunta: Como podemos diferenciar um som de um piano de um som de guitarra? A resposta é: Pelos harmônicos! Exatamente. São os harmônicos que definem o “timbre” do instrumento. Vejamos como é o gráfico (para um som de piano) em frequência da mesma nota que vimos para o violão (nota “mi” com frequência fundamental de 330Hz).   

Figura 5: Harmônicos da nota “mi” do piano.

Comparando o gráfico da Figura 5 com o da Figura 3, vemos que o gráfico em frequência da mesma nota “mi” é diferente nos dois instrumentos. Percebe-se uma diferença na quantidade e na amplitude dos harmônicos envolvidos nos sinais. É essa diferença que faz com que possamos diferenciar um instrumento de outro!
Mas poderíamos transformar um som de guitarra em um som de piano? Sim! Isso é possível! E isso é realizado também em sintetizadores de som. Ajustando a fundamental e os harmônicos de um sinal, podemos “imitar” o som de qualquer instrumento!

Equalizadores de áudio
E o que o equalizador de áudio tem a ver com os harmônicos?
O equalizador de áudio modifica as amplitudes de certas frequências do sinal de áudio, inclusive a amplitude dos harmônicos. Por isso conseguimos identificar uma diferença drástica quando mexemos nos botões de um equalizador (por exemplo, ao girarmos os botões de “grave”, “médio” e “agudo” em um pedal de efeito ou amplificador). Vamos ver como fica o gráfico em frequência daquela mesma nota de guitarra, mostrada na Figura 3, para dois tipos diferentes de equalização.
Analisando os gráficos da Figura 6 vemos que, na primeira equalização, demos um reforço nos graves, e na segunda, demos um reforço nos agudos. O vídeo com o áudio está logo abaixo. É nítida a diferença, não apenas sonora, mas visual!

Figura 6: Gráfico da guitarra com dois tipos de equalização.


Esperamos que você tenha aprendido um pouco mais sobre o que são harmônicos e a importância deles, e também sobre o funcionamento de um equalizador e como ele afeta os harmônicos.
            Dúvidas, sugestões, comentários sempre são bem vindos! A Oficina do Áudio agradece a todos os músicos e leitores que contribuem para que nossas matérias possam ficar cada vez melhores!

sábado, 13 de maio de 2017

Distorção ou Overdrive? O que são? Qual a diferença?

Edilberto Costa Neto, Gabriel Kulevicz da Silva


    Primeiramente, gostaríamos de agradecer ao pessoal que acessou, curtiu e compartilhou o blog, é com grande satisfação que escrevemos sobre esse tema para vocês! Nesta matéria, nós buscamos um pouco do histórico da distorção, seu funcionamento e quais as diferenças.

Histórico 


Na metade da década de 40, os amplificadores não apresentavam uma boa eficiência pois alguns componentes utilizados eram de baixa qualidade. A tecnologia da época era um tanto limitada e um componente destacou-se como referência: A Válvula.
As válvulas eram comumente utilizadas na telecomunicação como amplificadoras de sinal (rádio, telefone e outros). Devido a sua amplificação, passou a ser utilizada nos instrumentos musicais. Curioso né? Mas, por que falar disso?
Bom, foi nesta época que os guitarristas de blues, ao experimentar o sistema de captação Humbucker (até então só haviam Singlecoils que proporcionavam um baixo volume em relação ao Humbucker), começaram a perceber uma leve alteração no timbre quando o volume do amplificador (valvulado) era aumentado. A característica “quente” e um pouco distorcida que provocava uma certa agitação passou a ser percebida (um exemplo disso pode ser encontrado em: https://youtu.be/V7kbiclx8rs?t=401). A partir dessa descoberta, começaram a introduzir essa característica em sua performance. Assim foi o início do que chamamos de Rock!
Alguns anos depois, o uso de amplificadores em alto volume e potência, começou a prejudicar os cones dos alto-falantes. Por causa de um rasgo no cone, outro tipo de distorção foi descoberto. Esse som era mais “sujo” e diferenciava muito do que já era conhecido. Surgiram assim algumas nomenclaturas. O Overdrive ficou associado às válvulas, pela leve distorção em volumes medianos e pela característica “quente” e com “definição”, isto é, mantinha a característica do instrumento e dava uma pitada de distorção. Já o que conhecemos como Distortion, ficou associado ao som rasgado do cone rompido, como na música “You Really Got Me” do The Kinks (veja dois exemplos de Distortion aqui: https://www.youtube.com/watch?v=-2GmzyeeXnQ https://www.youtube.com/watch?v=gTKG68SmI3g).


Mas, peraí, os dois não distorcem o sinal da guitarra? Sim, porém há muita divergência quando esse assunto é tratado.

O Overdrive e a Distorção 


“Overdrive” pode ser interpretado como uma ultrapassagem de um limite. Para os músicos, o Overdrive está diretamente associado a uma distorção valvulada. Sob o ponto de vista da engenharia, ao realizar um Overdrive de um componente (Válvula, transistor, ampops e outros) estamos excedendo o seu limite e, por consequência, ocorre uma distorção do sinal.  A definição de “Distorção” aplicada a sinais elétricos está relacionada a deformações desses, sejam elas no sentido de uma informação, amplitude, frequência, tempo e etc.  
Não entendeu nada? Vamos tentar explicar melhor. Imagine uma caixa preta que apresenta uma entrada e uma saída. Na entrada, colocamos um pacote com “Círculos”. Vamos supor que a caixa só tenha capacidade de aumentar os “Círculos” em até 3 vezes o seu tamanho. O que aconteceria se colocássemos a máquina para aumentar em 3, 4 ou 5 vezes o seu tamanho original de entrada? 10 segundinhos para você imaginar a situação!



...



Então, a caixa preta possui um limite de aumento da figura. Os “Círculos” que possuírem aumento menor que 3, passariam tranquilamente, sem nenhum problema. Agora, quando escolhemos aumentar os “Círculos” mais do que 3 vezes, nós estamos excedendo o limite de processamento da caixa. A caixa preta vai tentar reproduzir o “Círculo”, mas devido ao fato de ela não ser feita para realizar essa amplificação, o que nós obtemos na saída não é um Círculo completo e sim um “Círculo” delimitado pelo aumento máximo da caixa preta. Consegue imaginar a figura deformada? A imagem a seguir ilustra o procedimento para facilitar a compreensão desse fenômeno!
          

Agora vamos trazer isso para um caso prático! Imagine um guitarrista tocando e ele está usando um pedal valvulado. O sistema é o seguinte:
  •          O sinal elétrico da guitarra entra no amplificador;
  •          O pedal valvulado processa o sinal;
  •          O som é reproduzido no alto-falante de um amplificador.
Primeiro caso (Ganho mínimo no pedal): O sinal da guitarra entra no pedal e este realiza sua tarefa. Após amplificar, o sinal segue para o alto-falante. O resultado é apenas de um som amplificado.
Segundo caso (Ganho médio no pedal): O sinal da guitarra entra no pedal e este realiza sua tarefa. Após amplificar, o pedal entrega o sinal para o alto-falante. Agora já podemos perceber uma leve alteração quando o alto-falante reproduz o som.
Terceiro caso (Ganho máximo no pedal): O sinal da guitarra entra no pedal e este realiza sua tarefa. Após amplificar, o sinal segue para o alto-falante. O som reproduzido está completamente deformado.
O sistema é muito similar ao da caixa preta, porém com algumas alterações. No caso do pedal, ele aceita qualquer sinal elétrico da guitarra. A limitação do pedal está no componente “Válvula”, que apresenta uma faixa de operação. Quando excedemos um pouco a faixa de operação (Segundo caso) o sistema deforma um pouco o sinal. O que vale ressaltar é que cada componente eletrônico tem um comportamento quando o seu limite é excedido. No caso das válvulas isso representa uma compressão do sinal (esse fator é o responsável pela “definição”) a partir do ponto de saturação (limite), e a deformação do sinal evidencia mais os harmônicos pares de baixa ordem (nosso próximo artigo será sobre harmônicos!). Por esse motivo, o som das válvulas é mais “quente”. No terceiro caso fica bem evidente a distorção.
Mas daí vem aquela pergunta: Posso utilizar “Transistores” ao invés de “Válvulas”? A resposta é SIM! As válvulas são componentes que gastam muita energia e também apresentam um preço mais alto em relação aos outros componentes eletrônicos (aqueles que são usados em amplificação e para distorção). Além disso, as válvulas ficaram um bom tempo sem serem produzidas. Por causa disso, os transistores foram utilizados para tentar substituir a válvula, porém, como mencionamos acima, cada componente tem uma característica diferente quando sofre uma saturação.
Você já pode perceber que no decorrer do texto foi mostrado que Overdrive e Distorção estão intimamente ligados. O ato de realizar um Overdrive provoca uma Distorção e nem sempre essa distorção vai apresentar as características de uma válvula, pois cada componente tem a sua resposta. Durante o tempo, os músicos atribuíram a distorção de válvulas ao termo Overdrive, e grande parte dos pedais de Overdrive disponíveis no mercado tentam imitar a saturação de uma válvula utilizando diferentes componentes (transistores, diodos, ampop, entre outros). Existem outros tipos de distorção também descobertos no decorrer do tempo e que serão discutidos ainda aqui na Oficina do Áudio!


Comentem, compartilhem e divirtam- se conosco!

sexta-feira, 28 de abril de 2017

Pedais de efeito de guitarra: Analógico X Digital

Gabriel Kulevicz da Silva, Edilberto Costa Neto
     
É com grande orgulho que apresentamos o primeiro assunto abordado na Oficina do Áudio. Escolhemos como primeira postagem um assunto polêmico que divide opiniões. Quem já não escutou frases do tipo: “Efeito digital é uma porcaria, o analógico é clássico, orgânico, e tem um timbre bem melhor”, ou ainda: “Efeito digital não tem personalidade”. Há aqueles que defendem o digital: “Eu uso digital pela praticidade... Um monte de efeito em um só pedal”, e comentários como esse também são comuns: “Se quiser um pedal digital de qualidade, vai ter que pagar muito caro!”.
        A partir desses e muitos outros comentários que escutamos de músicos, além de várias informações incorretas sobre o que seria um pedal analógico ou pedal digital, resolvemos criar nosso primeiro texto com esse assunto. Fique à vontade para comentar e dizer sua opinião!

Como o sinal de guitarra chega no pedal de efeito?

            Primeiramente, vamos ver como é o caminho do sinal de áudio desde o momento de sair da guitarra até chegar no pedal. A primeira etapa é quando o músico faz as cordas da guitarra vibrarem (bate nas cordas com a palheta ou dedos). Essa vibração das cordas produz as ondas sonoras. Essas ondas são mecânicas, invisíveis e se propagam pelo ar. Agora, como essas ondas sonoras chegam no pedal de efeito??? O componente mais importante para que isso aconteça é o captador da guitarra. Ele é o responsável pela transformação da onda mecânica gerada pela vibração das cordas em um sinal elétrico.

Figura 1: Vibração das cordas da guitarra.

Agora vamos tentar entender um pouco sobre como funciona a captação da vibração das cordas da guitarra. Essa parte da explicação é meio abstrata, mas vamos tentar deixar simples! Um captador de guitarra é composto basicamente por 6 imãs e um fio enrolado (bobina). Teste em casa você mesmo! Pegue um objeto de aço (uma chave de fenda, tesoura, prego) e coloque perto do captador. Você vai ver que ele vai ser atraído pelo captador.
Agora vem a grande mágica da ciência: transformação de um campo magnético variável em corrente elétrica. Graças a esse efeito, podemos ter energia em nossas casas (quem quiser saber um pouco mais sobre o funcionamento de uma hidroelétrica, veja o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=1QDosHWmRcM). Bom, deixando de lado a hidroelétrica e voltando a falar de guitarra, o que acontece na guitarra é parecido. As cordas (que são feitas de aço e consequentemente são atraídas pelo imã), ao vibrarem, afetam o campo magnético que está localizado entre as cordas e os imãs. Ao perturbar esse campo magnético, cria-se um campo magnético variável. Essa variação cria uma corrente elétrica no fio que está enrolado no núcleo. Esse é o sinal elétrico da guitarra que segue para o cabo e depois para o pedal. A Figura a seguir ilustra esse procedimento:

Figura 2: Geração do sinal elétrico da guitarra.

Caso você não tenha entendido muito bem como funciona todo esse esquema, não tem problema. O principal objetivo aqui é entender que, ao tocar as cordas da guitarra, o captador faz uma mágica que transforma essa vibração em um sinal elétrico, que segue para o cabo da guitarra e para o pedal.
Agora vem a pergunta: “Tá... Mas esse sinal é elétrico, então consequentemente ele é digital?” A reposta é não! Esse sinal é analógico e entra no pedal de efeito sendo um sinal analógico. O processamento desse sinal pelo pedal é que pode ser feito de forma analógica ou digital.

Sinal analógico X Sinal digital

A grande diferença entre um sinal analógico e um sinal digital é que, para ser obtido o sinal digital, é necessário transformar o sinal elétrico analógico (que sai da guitarra) em um sinal digital, que é processado pelo pedal. Mas o que seria um sinal digital? Vamos tentar entender essa diferença entre analógico e digital através do desenho da Figura 3. O desenho à esquerda é feito por uma linha contínua, sem interrupções e representa o sinal elétrico de áudio que sai da guitarra. Já o desenho da direita, é o desenho da esquerda no formato digital. Veja que ele possui apenas algumas informações e não é contínuo.

Figura 3: Analógico x digital.

Agora vem a questão. Como saber se um sinal digital é tão bom quanto um analógico? Veja a Figura 4.

Figura 4: Qualidade de amostragem do sinal analógico.

Temos o mesmo sinal digitalizado com qualidades (resoluções) diferentes. Repare que no primeiro e no segundo caso, é nítida a diferença entre o sinal analógico e o sinal digital. Já para o terceiro sinal, nem percebemos a diferença entre o analógico e o digital. Quem é responsável por essa qualidade é um parâmetro chamado “frequência de amostragem” (em inglês, sampling frequency ou sample rate). Outro parâmetro importante no processo de digitalização é a quantidade de bits (esse tópico será discutido mais a frente!) utilizada. Esse parâmetro é responsável pela quantização da amplitude digital (esse assunto não será abordado nesse texto, futuramente faremos uma matéria sobre isso). Você já deve ter visto algum desses termos nas especificações de pedais digitais ou softwares de gravação.
Resumindo, quanto maior a frequência de amostragem, mais pontos do sinal analógico estarão presentes no sinal digital e mais ele vai se assemelhar ao sinal analógico. Esse é o primeiro ponto para saber se um pedal de efeito digital é de qualidade: Precisamos olhar qual é a frequência de amostragem utilizada no pedal. Agora... como quantificar essa qualidade? Como saber qual sample rate mínimo para que a digitalização seja imperceptível sonoramente?
Antes de continuarmos, precisamos de uma informação importante: O ouvido humano consegue perceber sons de frequências presentes na faixa de 20Hz a 20kHz. Ou seja, as frequências importantes dos sinais de áudio estão nessa faixa. Fora dessa faixa, poderíamos cortar tudo que não faria diferença nenhuma para nossos ouvidos. Se você está interessado em tocar para seu cachorro, gato ou morcego, aí é outra história... (o ouvido deles difere sons de frequências mais altas que 20kHz). Mas vamos nos ater ao ouvido humano!
Então, como saber qual a frequência de amostragem que consiga digitalizar com qualidade toda essa faixa de frequências? Para essa pergunta, usamos um teorema feito pelo engenheiro Harry Nyquist chamado de “Teorema de Nyquist” ou “Teorema da Amostragem”, que fala que a frequência de amostragem de um sinal deve ser pelo menos o dobro da maior frequência desse sinal. Ou seja, no caso do sinal de áudio, a maior frequência seria 20kHz, o dobro disso é 40kHz. Assim, uma frequência de amostragem de 40kHz é aceitável para sinais de áudio. Talvez você já deve ter visto em algum lugar a frequência de amostragem de 44,100 kHz. Essa é a frequência de amostragem utilizada na grande maioria das músicas comerciais gravadas em CD. Perceba que é um pouco mais do que o dobro dos 20kHz.
Chegamos a um ponto interessante. Oras... Se o sinal for amostrado de forma correta e possuir resolução relativamente boa (conversor analógico-digital de 16 bits para cima), então o sinal digital é tão bom quanto o analógico. Sim, isso é verdade, pois não conseguimos perceber sonoramente essa diferença caso o sinal seja amostrado corretamente. Mas uma coisa é certa: Um sinal digital NUNCA será tão contínuo quanto um sinal analógico. Sempre serão pontos amostrados. Os mais puritanos utilizam esse argumento para questionarem a qualidade dos sinais digitais. Teoricamente e filosoficamente eles podem até estar corretos, mas se não percebemos essa diferença auditivamente, qual seria o sentido de falar que um é melhor que o outro?

Processamento analógico X Processamento digital

Para concluir, vamos expor mais um ponto importante da nossa discussão. Sabemos que para um sinal de áudio digital ser tão bom quanto um analógico, ele deve ter sido amostrado com uma frequência de amostragem de pelo menos 40kHz. Contudo, há mais uma questão a ser abordada no processamento digital de efeitos de guitarra. Essa questão é referente a características singulares presentes no processamento do áudio pelos pedais de efeito. Tais características singulares não são facilmente representadas digitalmente. Um exemplo é o pedal de distorção, que altera o sinal original através da saturação de componentes gerando inúmeros harmônicos (em breve faremos um post sobre o que são harmônicos) nesse sinal. Mas em suma, o que acontece é que o sinal de áudio começa a ter características que demandam uma frequência de amostragem muito superior e um processamento digital muito complexo.
Além desse exemplo, existem outras características singulares relativas aos próprios componentes, e são muito difíceis de serem reproduzidas. É o caso, por exemplo,  da válvula (presente em alguns circuitos de distorção) que esquenta com seu funcionamento. Esse efeito térmico de certa forma afeta no som gerado. Como digitalizar isso??? Vários estudos foram e ainda estão sendo realizados sobre formas de implementação de efeitos digitais na tentativa de digitalizar essas características presentes nos pedais de efeitos analógicos. Para quem gosta de textos acadêmicos, deixamos aqui uma sugestão para quem quer conhecer um pouco mais sobre um estudo realizado nesse sentido: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/167604.
E você? O que acha sobre o assunto? Qual a sua opinião? Tem preferência por pedais analógicos ou digitais?  

P.S.: Deixamos aqui um Post Scriptum de um ponto que achamos importante de ser abordado. Ao pesquisar sobre alguns pedais de efeito, vimos um vídeo falando que um pedal que estava sendo vendido era totalmente analógico porque não utilizava CI e só usava transistores e componentes passivos. Isso é besteira! CI (que quer dizer circuito integrado) é um aglomerado de componentes que são encapsulados (aqueles componentes que se assemelham a uma barata). Existem CIs que fazem processamento digital, mas também existem CIs que fazem processamento analógico, é o caso dos ampops (amplificadores operacionais).